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AGULHAMENTO À SECO

O agulhamento seco (AS), utilizado para tratamento da dor miofascial (DM), apesar de ser confundido com a acupuntura tradicional chinesa, é uma técnica ocidental baseada em princípios neurofisiológicos distintos. O AS foi desenvolvido originalmente com o objetivo de desativar pontos-gatilho miofasciais (PGM). Esses são caracterizados por um ponto hiperirritável, localizado em uma banda tensa de um músculo, ou fáscia muscular associado à dor local e/ou referida. Estão também associados às manifestações clínicas da DM e fonte de sensibilização periférica e central.

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No entanto, para que a prática do Agulhamento Seco não seja confundida com a da Acupuntura, podendo ser diferenciadas em termos históricos, contexto filosófico, indicativo e prático. O Agulhamento Seco utilizado por fisioterapeutas é baseado na neurofisiologia, neuroanatomia e estudo científico moderno do sistema nervoso e musculoesquelético.

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MECANISMOS DE AÇÃO E EFEITOS FISIOLÓGICOS

 

Os efeitos de diminuição da dor e da tensão muscular, da melhoria da coordenação e do comprimento muscular, além do restabelecimento da mobilidade atribuída ao AS são bastante complexos e estão associados à desinibição dos PGM. Por isso, serão descritos inicialmente a fisiopatologia da formação do ponto-gatilho (PG) e posteriormente os mecanismos que explicam os efeitos dos AS agrupados em locais, segmentares e extrassegmentares, Esses efeitos se diferenciam conforme a localização, a profundidade e a movimentação da agulha além da presença ou não a RCR.

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PONTO-GATILHO MIOFASCIAL

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Os PGM podem ser objetivamente observados em exames de ressonância magnética nuclear (RMN), de ultrassonografia (US) e de termografia infravermelha (TIN). Os dois primeiros exames são de difícil aplicação na prática clínica pelo alto custo, enquanto que no caso da TIN há falta desse equipamento em serviços especializados e em hospitais. Diante disso, a sua identificação deve ser realizada por meio de palpação manual, ou pelas técnicas de rolamento ou de pinçamento dos músculos afetados, seus sinergistas e seus antagonistas. Após a identificação, os PGM podem ser classificados em três subtipos: ativos, latentes e satélites, dos quais os dois primeiros são os mais abordados pela terapia de AS. O PGM ativo é doloroso espontaneamente, produzindo um padrão de dor à distância. O latente caracteriza-se por desencadear dor somente quando estimulado, enquanto o satélite é resultado de PG primários (latente ou ativo) presentes por longos períodos de tempo.

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FISIOPATOLOGIA DO PONTO-GATILHO MIOFASCIAL

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Segundo as pesquisas atuais, existem três fatores essenciais envolvidos na formação do PGM: liberação excessiva de acetilcolina, o encurtamento dos sarcômeros e a liberação de substâncias inflamatórias e algogênicas como, por exemplo, a substância P. O aumento de acetilcolina na junção neuromuscular causa elevação da tensão das fibras musculares e, consequentemente, isquemia e hipóxia localizadas que induzem à liberação de substâncias algogênicas (crise energética). Essas substâncias causam maior liberação de acetilcolina completando um ciclo vicioso. A manutenção dos estímulos nocivos aumenta progressivamente a sensibilização do corno dorsal da medula e neurônios, antes silenciosos, passam também a enviar estímulos ascendentes, ativando sistemas supraespinais que resultam na sensibilização central.

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EFEITOS LOCAIS

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A inserção da agulha no PGM lesiona e/ou destrói as placas motoras, com consequente desnervação axônica distal e indução de regeneração fisiológica, que ocorre após 7 a 10 dias. Essa lesão é focal e não causa risco significativo de formação cicatricial. A RCR, quando atingida, diminui a ativação elétrica da placa motora afetada (pela diminuição da ação excessiva de acetilcolina), fato observado pela diminuição da atividade elétrica espontânea na zona das bandas tensas.

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Outro provável efeito local é o alongamento das estruturas citoesqueléticas, seguido de recuperação do comprimento normal dos sarcômeros devido à diminuição da sobreposição dos filamentos de actina e da miosina. A pressão mecânica provocada pela agulha associada à sua rotação, polariza o tecido conjuntivo, que possui a característica intrínseca de pisoeletricidade. Esse estresse mecânico transformado em atividade elétrica parece auxiliar a remodelação tecidual.

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Quando a agulha é inserida, um reflexo axônico é disparado na rede terminal das fibras A delta e fibras C, que está associado à liberação de várias substâncias vasoativas. Essas atuam na vasodilatação e no aumento do fluxo sanguíneo local que resulta em redução da concentração das substâncias algogênicas, e diminuição da ativação dos nociceptores culminando na resolução da sensibilização periférica. Além da vasodilatação local, um estudo com a utilização de câmera termográfica demonstrou vasodilatação distal, na região de referência da dor.

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TÉCNICA DE APLICAÇÃO

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O AS pode ser utilizado com a técnica profunda (ASP) e a superficial (ASS). No ASP a agulha é inserida, através da pele, e se aprofunda em direção ao centro do PGM. Quando o sinal de RCR é provocado, a técnica parece ser mais efetiva, provavelmente pela rápida despolarização das fibras musculares envolvidas, associada à contração reflexa.

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Um estudo recente2 de revisão concluiu que a RCR não é um componente crucial no tratamento. O ASP atinge os receptores polimodais das unidades motoras e, estudos sugerem que esses receptores são mais efetivos em induzir analgesia do que os receptores cutâneos. Esses receptores respondem a estímulos químicos, térmicos e mecânicos e podem gerar efeitos analgésicos efetivos quando estimulados pelo agulhamento. O ASP está associado à diminuição na ativação das placas motoras terminais envolvidas na redução da dor local e referida, ao aumento da amplitude de movimento e à redução na concentração de substâncias inflamatórias presentes no local do PGM.

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Este pode ser realizado com diferentes formas de penetração da agulha. Na técnica estacionária, a agulha é inserida no local desejado e mantida sem nenhuma manipulação extra. Na pistonagem, a agulha é inserida e parcialmente retirada, repetidas vezes, no ponto escolhido e ao redor dele. Outra forma de aplicação é realizar rotações da agulha, nos sentidos horário e anti-horário, mantendo-a fixa em um mesmo ponto. Essa rotação parece ativar mais precisamente as fibras C e os mecanorreceptores superficiais e profundos quando comparada à pistonagem2. Acredita-se que a pistonagem seja mais efetiva em provocar um relaxamento local das fibras musculares, porém está associada à maior número de efeitos adversos. Já o modo estacionário parece ser mais efetivo como analgesia.

 

No ASS a agulha é inserida no local do PGM, na camada subcutânea, entre 5mm e 10mm de profundidade, numa angulação entre 20 e 30°. Pode ser mantida fixa no local, ou serem realizados movimentos de rotação da agulha. Por não penetrar no tecido muscular, não é esperada a RCR. O ASS apresenta a vantagem de ser menos doloroso que o ASP, além de ser indicado para aplicação em áreas consideradas de risco como pulmões e grandes vasos. Estudos mostram que o ASS é mais eficaz que o placebo em diminuir quadros dolorosos.

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O ASP ou ASS podem ser utilizados em músculos situados distalmente em relação ao PGM ativo em um mesmo dermátomo3. O efeito analgésico e sedativo alcançado pode ser explicado pelo fenômeno de controle inibitório nocivo difuso. Essa forma de agulhamento pode ser escolhida quando a área principal a ser tratada está muito sensível (hiperalgesia e/ou alodínea).

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TEMPO DE APLICAÇÃO E FREQUÊNCIA

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Estudos não são conclusivos quanto ao melhor tempo de permanência das agulhas em ambas as técnicas, e nem há consenso em relação à quantidade de sessões necessárias4. Na prática clínica há uma variação de 5 até 30 minutos de duração4. Alguns autores indicam de 2 a 3 sessões para casos agudos e 3 a 5 sessões para casos crônicos.

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CONTRAINDICAÇÕES

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As contraindicações absolutas do AS são: fobia à agulha, áreas com linfedema, urgências médicas, histórico de reação anormal a procedimentos anestésicos e estados de inconsciência, ou confusão mental. Já as contraindicações relativas são: terapia com anticoagulante, distúrbios vasculares, epilepsia, alergia ao metal da agulha, gravidez e em crianças

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acupuntura
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